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De volta a esse lugar - por Cris Lira

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I magem Pinterest De volta a esse lugar (por Cris Lira) Daqui do outro lado deste sol, meu intervalo de tempo entre o almoço e o encontro marcado faz-se quase da metade reduzido. Entre um lá e um cá, ouço sobre drinques, máscaras, viagens, faces. Eu, estanque, corpo mergulhado na banheira de água fria deste meu apartamento na vila universitária de uma cidade que não habito, reduzo-me a uma observadora. Na tela do computador, a coloração das folhas mudou de lugar pelo menos duas vezes enquanto encaro os textos que me confrontam. O tique-taque do aplicativo do celular me informa dos intervalos para viver entre uma escrita e outra ao tecer o artigo de que nem gosto, mas é necessário para que eu continue a ser a cidadã desenhada na canção de Raul Seixas, esperando, com a boca cheia de dentes, a morte chegar. Os arroubos de luzes invadindo o apartamento, neste verão americano, interrompem meu ritmo de escrita. O olhar para a esquerda observa um último sereno na criança que

Morgana Poiesis | um conto e um poema

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Edward Ladell NOTAS DE UM OUTONO ANTES QUE TARDIO ( por Morgana Poiesis ) (…) caiam as folhas ao vento, às margens do rio, sob o sol brando de outono. As flores cultivadas na primavera haviam sido queimadas ao calor mesmo do verão, e agora uma cesta com frutas apodrecidas sobre a mesa, de tudo que colhera nas últimas estações. Olhava para ela como quem contemplava a própria morte, silenciosamente, enquanto fumava o seu cigarro habitual, na porta da cozinha, logo pela manhã. Lembrava de uma parábola em que as frutas estragadas deveriam ser separadas daquelas em bom estado, pois estragariam todo o resto. Mantinha-se passiva diante da necessidade dessa seleção, a inércia se sobressaía à consciência, e as frutas seguiam em um lento processo de desintegração, à sua frente e pelo decorrer dos dias, preenchendo o ambiente com um dissabor insuportável. Logo o outono se transformaria em inverno, e o que seria dela se    degenerasse junto com as frutas? Sentia o aroma do café que

Coluna | Ouvindo Mulheres 11 - O poder sagrado de Auritha Tabajara

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Ouvindo Mulheres - 11 por Cris Lira Olá, leitoras e leitores! Na coluna de hoje, trago o trabalho de Auritha Tabajara, a primeira cordelista indígena do Brasil. Natural do Ceará, a autora escreveu seu primeiro cordel aos 8 anos de idade e, em 2007, publicou seu primeiro livro Magistério indígena em verso e poesia.  Durante o curso de pós-graduação "Deslocamentos na literatura brasileira contemporânea," ministrado pela Professora Doutora Cecília Rodrigues, da Universidade da Geórgia, nos Estados Unidos, o estudante de doutorado Daniel Ferreira da Silva encantou-se com os cordéis da autora e começou a trabalhar na tradução de um deles. Nesta coluna, tenho o prazer de trazer para vocês a tradução feita por ele do cordel de apresentação de Auritha Tabajara. Como verão no vídeo, faço uma pequena introdução à autora em inglês e em seguida fazemos uma leitura bilingue do cordel. Espero que aproveitem a oportunidade de escutar a voz dessa mulher guerreira cujos versos ecoam

PodPapo 04 | entrevista com a professora e escritora Divanize Carbonieri

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|  PodPapo 04  | PodPapo - Entrevista com a professora e escritora Divanize Carbonieri por Chris Herrmann A quarta edição  da nossa coluna de entrevistas em formato de áudio é com a escritora Divanize Carbonieri . Foram 24 minutos de uma conversa deliciosa sobre a produção literária da autora desde o seu início e outros assuntos ligados às suas atividades profissionais e culturais. A entrevista foi realizada na data de hoje, via WhatsApp. Para ouvir clique na seta abaixo do nosso Podcast: Divanize Carbonieri é paulista, residente em Cuiabá/Mato Grosso. É autora dos livros de poesia Entraves (2017), agraciado com o Prêmio Mato Grosso de Literatura, Grande depósito de bugigangas (2018), selecionado pelo Edital de Fomento à Cultura de Cuiabá/2017, A ossatura do rinoceronte (2020) e Furagem (2020), além da coletânea de contos Passagem estreita (2019), selecionada pelo Edital Fundo 2019/Cuiabá 300 anos. No Prêmio Off Flip, foi segunda colocada na categor

O lirismo de Patrícia Pinheiro | 7 poemas

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Monika Luniak Dou de beber ao passado e recordo que doer é finito e que viver não passa de assoprar velas coloridas de impermanência. ### Monika Luniak Eu me descuidei da matemática dos teus anos. Quando me perguntam com que idade tu viraste poeira estelar e deixaste de segurar minhas mãos assustadas e incompletas, eu tento fazer as contas e me distraio. Acho que eu fingi que os caminhos não te roubaram antes de eu estar pronta; que ainda não restariam muitas partes de mim que necessitariam do teu colo. Mas eu entendo. Eu aceito. Eu prossigo. E te abraço e te conto sobre o que eu descobri sobre o mundo quando te sonho. Só não me peças para lembrar há quantos invernos tu não respiras porque nem meus pulmões se acostumaram com estes cômodos que nunca mais estarão impregnados do cheiro do teu cigarro preferido. ### Monika Luniak Visito teu nome na a

A poesia bela e visceral de Jade Luísa

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                                                          Imagem por: Izabela Ewa Oldak Sobre o dia em que a lua emudeceu Esta noite a Lua é prata E a glória chove, crua. Enquanto a chuva anula o canto, emudece o riso, o riso gigante como o céu. - o silêncio é infinito, mais infinito que o canto de quem engole o céu. Sua palavra é sempre grito (ora bicho, ora nuvem) Anoitece, voa o grito: mulher! Pois ainda bicho ou nuvem ou mãe Canta e grita, vira prata e azul, e sangra em letras, ovula em luta. Mais poeta que felina-anoitecer Olha, arredia, a presa o poema, a noite prata e fresca. A noite grita: sou prata e fria! Mãe, me ensina a virar bicho. Regurgito as palavras que me engasgam, mordo os beiços, os seus beiços - Foi quando me lembrei da primeira vez que vi minha mãe chorar.                                                                   ***