A POESIA DE PATRÍCIA CACAU | Projeto 8M



fotografia do arquivo pessoal da autora 

8M (*)

Mulheres não apenas em março. 
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto, de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas, utópicas.
Mulheres de verdade, identidade, realidade.
Dias mulheres virão, 
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
(Nic Cardeal)


Viaje na poesia sentimental e romântica de PATRÍCIA CACAU:

REENCONTRO 

Pedi mais uma garrafa de vinho
Agora pode ser qualquer rótulo 
estado, país 
Um tira-gosto?
Não, não tira nada.
Acrescenta. 
Aprofunda.
O tato.
O papo.
O fato.
E o adeus!

(* poema do livro Quintais, p. 17)


imagem do Google 
-*-


QUINTAIS

Relembro os meus quintais,
as emoções não tinham lugar,
o coração apertava,
o pulso acelerava,
os dentes rangiam,
a alma enrolada na dor
que parecia não ter fim,
aqueles quintais
convidaram à solidão
dos dias meus.
A lua insistia em ser cúmplice,
tão solitária quanto eu,
contemplava o momento.
É preciso viver os instantes,
fitava o muro
que cercava aquele quintal
e a minha vida,
precisava escrever
no muro os meus desejos,
pular o muro e vencer os medos.
Via a velha roda à minha frente
que mostrava que a vida gira
e tudo se desgasta,
gastos momentos de ansiedade,
o sol naquele quintal
reflete o meu anseio,
a mudança me aguardava do outro lado.
Velhos quintais que aguardaram a minha dor
O teu amor
enterrei naquele vaso de plantas
com as incertezas
decorei as decisões
Pulei cercas
refiz muros
cultivei flores vivas
agradeci aos quintais da minha terra
porque agora sorrio em outros quintais.

(* poema do livro Quintais, pp. 20/21)

capa do livro Quintais 
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CARTA DE DESPEDIDA

Quando a morte me arrastar de surpresa 
Irá deixar acesa 
a lâmpada que iluminava as letras 
do papel rabiscado.
Acesa a chama dos corações que despertei.
Acesa a boca do fogão que alimentei.
Aceso o lampião da mesa.
Aceso o sol dos que ficaram.
Acesa a lua que iluminará as noites de saudade.
Apaga a luz do meu quarto. 
Que levo acesa a luz infinita do amor.

(* poema do livro Quintais, p. 43)

imagem do Pinterest 
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O VAZIO

Quando você se foi de mim
Fiquei como um corpo que vaga
Vazio de alma
Um vácuo no saco plástico de embalagem sem conteúdo.
Um pensamento sem emoção 
Sem memória 
Sem ti
Não havia onde repousar as minhas ilusões. 
E nem aquela paixão atrevida, desmedida de nós. 
Era um olhar profundo 
Que alcançava terra de ninguém 
Quando você se foi de mim
O vazio ocupava-me de ausência 
Sem par
Sem fim
Até o vento parou de viajar com teu cheiro bom
Tentei te segurar na paragem do tempo
Mas há amnésia nas nossas lembranças 
Tua voz 
Um eco nos labirintos da velha cabeça que deitava no teu peito.
No travesseiro úmido do choro
Ainda oro no leito em gratidão por tudo que fomos.
Ou por tudo que ainda seremos nesses vazios preenchidos de solidões.

(* poema da antologia Mulherio das Letras Portugal - Poesia, 2020, p. 274)

imagem do Pinterest 
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A GARRAFA

Ele compreendeu
que ela não caberia numa garrafa
Que não lhe daria um rótulo
E lançou-me ao mar
Seguindo os dias à deriva
Encontro-me além do mar... Livre 
Ele leu:
Aquela mulher que não coube na garrafa
ela cabe no livro
Livre no livro
Livro-me de todas as dores
e me sinto livre
Com título e não rótulo.

(* poema da antologia Mulherio das Letras Portugal - Poesia, 2020, p. 275)

imagem do Pinterest 
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ORAÇÃO DA POETA MISERÁVEL

Livrai-me nossa senhora das academias de todas as vaidades, peço perdão com toda devoção às damas, embaixadoras, comendadoras, aristocratas das bem-aventuranças da literatura. 
Não tenho estrutura social,
nem mental de viver nessa sociedade literária narcisista.

Talvez seja uma falha grande de caráter.

Minha santa dos cards coloridos, confesso. 

É que já nasci prostituta do poema,

Puta de verso torto,

Piriguete de poeta marginal. [Disléxicos dos autorais direitos de escrever]

Minha santa barroca do pau oco de empatia, 
te peço que rogue por mim e por eles.

Nós enlouquecemos pela poesia. 
Mas que atire a primeira caneta! Quem nunca entortou um verso, esqueceu uma vírgula, fez um trocadilho e perdeu a rima?

Rogo que conceda forças e ensina-me a limpar o meu próprio umbigo sem importar com opiniões outras.

E não por desaforo, atrevimento, ou por viçosa demais seja a minha reza!

Se possível for, reserva um lugar à margem do teu manto de papel para que possa escrever os meus versos.

Aguardo ansiosa por vossa divina misericórdia.

Em nome da palavra viva /
POESIA.

Amém.

(* poema extraído de sua TL, de 08.07.2022)

imagem do Pinterest 
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(*) 8M: 8 de Março = Dia Internacional da Mulher: Projeto 'Homenagem a mulheres escritoras/artistas', iniciado em março/2021, por Nic Cardeal.


fotografia do arquivo pessoal da autora 

PATRÍCIA CACAU (Sânzia Patrícia Cacau) é natural de Natal/RN. Depois de morar em Fortaleza/CE e em Linz/Áustria, atualmente reside novamente em Fortaleza.

É  empreendedora social, poeta, articuladora cultural e literária. Participou de oficinas de escrita terapêutica na Central de Escritores (Fortaleza/CE). É integrante do Movimento Mulherio das Letras Brasil e Europa. Incentivadora do Movimento Mulherio das Letras/Ceará.

Participação em coletâneas e antologias: Antologia Comemorativa Dia Internacional da Mulher - Mulherio das Letras Portugal Poesia (In-Finita Portugal/2019); Mulherio das Letras Portugal - Poesia (In-Finita Portugal/2020); Se essa Lua fosse nossa - Coletânea Enluaradas I (e-book, 2020).

Livros publicados: Poesia Nordestina (zine de poesia, Projeto 'Zines de Temporada', Aliás Editora/2020); Quintais (poesia, In-Finita Portugal/2020).


Comentários

  1. Sou fã , admiradora do fogo que arde nas palavras dessa poeta. Cacau é o gatilho , o impulso para que mais mulheres escrevam sem papas na língua.

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