De Prosa & Arte | A sombra da Morte



Coluna 35

PublicDomainPictures por Pixabay


A sombra da Morte

Todos os dias eu temo morrer. Todos os dias a mesma sombra, a mesma sensação, a mesma faceta mórbida do desespero me consome. Acho que a tempos venho fugindo da morte, desviando dos seus olhos profundos e vazios, não sei se consigo essa sorte. 


Na verdade, quanto mais o tempo passa, mais volumosa e aparente é a Sombra, e o relógio anda a contragosto da minha espera... O corpo vai dando sinais da maturação acelerada. A gente retarda a ideia com bons presságios, mas cada vela no bolo é mais um dia diante da passagem futura.


Minha morbidez, vem desses dias densos de passagens aos milhares, com um monstro invisível pairando no ar que respiramos. Começamos a nos dar conta de quão importante é respirar sem bloqueios, acho que nunca agradecemos fielmente essa possibilidade.


Eu tenho medo de morrer e sei que não devia… porque essa roupagem terrena, é inerente a forma como eu densifiquei meu carma e minhas pagas nessa breve existência física. A vida é cíclica no Astral, só o corpo físico perece, envelhece e retorna aos elementos. Minha consciência e espírito permanecerão ativos pra assumir outra capa terrena. Eu não devia temer.


Tenho medo que as palavras morram comigo, antes de dizerem sem reservas a quem quero bem, do meu querer. Tenho medo que morram comigo: os sonhos que ainda não realizei, os projetos que não concluí, as esquinas que não dobrei, os amores que não vivi, os sucessos dos filhos que virão.


Caminho anestesiada, em choque, vendo as despedidas. Parece que não mais nos surpreendem. Todos os dias, me pergunto se já dei conta do que me foi reservado. Se já anotei todas as senhas, paguei as contas mais importantes, deixei algo pronto na geladeira caso alguém precise comer.


Tenho medo de faltar e não fazer falta nenhuma. Alguém pagará as contas, fará o almoço, e reorganizará as senhas, porque as coisas vão caminhar para além da minha existência física. 


Ando paranoica, hipocondríaca, confusa e tateando os labirintos dentro de mim, pra expurgar essa sensação de que a morte me espreita. Eu não devia temer. Se sou cheia de vida, em sua contraparte a morte também me habita, anda comigo desde o primeiro respiro. Como diria minha avó: “Ninguém morre às vésperas”. Temo desconhecer a véspera.


Esse é um tempo de destempero emocional, se não nos mata em definitivo a Sombra, nos mata aos poucos o assombro, o medo e o pouco juízo. 


Entre os disparates ou surtos, sonho dias melhores, para que eu possa esperar as vésperas com leveza, respirando sem bloqueios, abraçando apertado, amando sem freios, dizendo o não dito… e declarando sem reservas o bem querer que carrego, ignorando a escuridão, os fracassos e o medo.


Siala por Pixabay


 

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