A poesia contundente e bela de Iolanda Costa

Herança

O ponteiro sela a hora e nunca estivemos tão próximas,
assim, como quando faltou-lhe a respiração.

O corpo crescido do outro, o corpo devotado do outro,
a gene, a cromossomática generosidade

das seres que se perpetuam em assíduo encarne:
cabelo trompa boca lábio vulva mama.

A mãe morta.



Hipátia

As bruxas fazem ciência e vaticinam.
Seus óvulos trópicos esperam
a terra adorada, a que não vem
o ventre invertido que não gera.
Vertem seus mênstruos a cada lua
e buscam a si como oroboros
loucos e dissidentes.
"Toda quintessência é uma pedra
que não é pedra”, dizia Maria
(a de Alexandria)
a que calcinava enxofre e cobre.





áries

a mulher em cópula
refebra o signo

viva tão híbrida
feito uma rosa
de silfo na abóbada

deva tão mônada
feito um ornado
de silvas no carneiro

áries em asa
e azuis teus cornos:

- corpo celeste
como rama de losna

  

ultramarina  

então o mar, inaê
é azulina de mágoa

salina escumada
de boca, água
de língua vega

solidão de alga
vaga, a lua
quando míngua



Iolanda Costa, poeta de Itabuna - BA, editou artesanalmente os folders de poesia Às canhas as palavras realizam mil façanhas (1990), A óleo e brasa (1991) e Antese (1993). Tem poemas publicados em jornais, agendas, antologias, revistas impressas e eletrônicas e blogs. É autora de Cinema: sedução, lazer e entretenimento no cotidiano itabunense (2000), Poemas sem nenhum cuidado (2004), Amarelo por dentro (2009), Filosofia líquida (2012) e Colar de absinto (2017). Coordena a coleção de plaquetes poéticas Pedra palavra (2012-2020).


(Imagens: 1. Kelly McKernan/Dusum - 2. Paul Van Gilkel - 3. Ashvin Harrison)

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