Postagens

Mostrando postagens com o rótulo contos

Uma resenha de Marta Cocco | "Uma Diva na passarela estreita do Jabuti"

Imagem
  Jerzy Górecki. Fonte: pixabay.com Uma resenha de Marta Cocco Uma Diva na passarela estreita do Jabuti Pela primeira vez na história da literatura produzida em Mato Grosso temos uma finalista em uma categoria literária do prêmio Jabuti. Esse prêmio é considerado o Oscar do livro brasileiro. Michele Sato, em 2006 também chegou à final, mas na categoria acadêmico-científica, e Joca Terron, em 2012. Mas Joca Terron, embora nascido em Mato Grosso, não publica por aqui e chegou por uma grande editora, a Cia das Letras. Divanize se inscreveu no prêmio com o livro de contos Passagem Estreita , editado pela Carlini & Caniato sediada em Cuiabá. Se Divanize ficará com o primeiro lugar, é o de menos. O de mais foi ter conseguido essa distinção, num prêmio que tradicionalmente destacou autores e autoras famosos/as, de grandes editoras, de grandes centros. (Embora essa noção de centro já seja questionada há tempos e, geograficamente falando, Cuiabá esteja no centro geodésico da América Latin

Dois contos de Flávia Helena | "Amor não se joga fora" e "Terra Seca"

Imagem
  Paula Rego Dois contos de Flávia Helena Amor não se joga fora   Não que fosse possessiva, mas nunca se desfez de seus antigos amores. Quem já se apaixonou uma vez deve saber muito bem: os amores invadem nossos corpos. Pelos poros, olhos, boca. Adentram em forma de suor, olhares, saliva. Quando são intensos, perfuram as veias, misturam-se ao sangue e se instalam no coração. Como no dela sempre houve espaço, decidiu deixá-los quietos por lá mesmo depois que os romances se acabavam. Até que conheceu Bernardo. Ele, diferente dos outros, não precisou percorrer longos caminhos pelo corpo da moça. Foi logo na primeira noite que entrou direto pelo útero e rápido chegou ao coração. Ocupou todo o espaço que havia, expulsando os amores que estavam guardados. Eram dois. Ela menstruou na manhã seguinte, embora ainda não fosse o dia previsto. Juntou em um potinho todo o sangue grosso que, durante sete dias, saiu de dentro dela. Diluiu tudo em água e deixou a mistura fervendo em u

Divina Leitura | Temas e Tramas em "Sem Açúcar" de Flávia Helena

Imagem
  Coluna 08 Temas e Tramas em Sem açúcar de Flávia Helena - por Divanize Carbonieri Sem açúcar  (2016) de Flávia Helena é composto por 27 contos, sendo que 19 têm protagonistas mulheres, 5 têm protagonistas homens e 2 têm personagens trans, que fazem a transição de um gênero para o outro. No conto "A cada qual o seu quinhão", o papel de protagonista parece ser dividido entre os personagens: a mãe, o filho e a filha. Entre as protagonistas mulheres, 4 são idosas ou começaram a envelhecer e 2 são crianças. Entre os homens, 2 são idosos ou envelhecem durante a narrativa e 2 são meninos. Todos os contos apresentam uma voz narrativa de terceira pessoa. O subjetivo é narrado não a partir de dentro, como seria o mais esperado, mas de fora. Uma consciência serena observa e apresenta personagens transtornados em ambientes e eventos desfigurados. A vivência da dor não é dada por uma identificação direta, que poderia seguir um imediatismo trágico e irremediável. Ao contrário, ela par

Divina Leitura | O Afrofuturismo em "Sankofia" de Lu Ain-Zaila

Imagem
  Coluna 07 O Afrofuturismo em Sankofia de Lu Ain-Zaila - por Divanize Carbonieri Sankofia (2018) de Lu Ain-Zaila é um livro afrofuturista. Em vários momentos, sua autora trabalha na intersecção entre ensaio e ficção. O próprio subtítulo não deixa dúvidas quanto a isso: Breves histórias sobre afrofuturismo . Logo no início, no local em que normalmente se encontram os prefácios, Ain-Zaila apresenta uma certa genealogia do termo, provavelmente desejosa de que suas leitoras não percam de vista o aspecto político da obra, mesmo que as ficções ali sejam altamente envolventes. Segundo ela, o afrofuturismo relaciona-se com a prontidão dos povos negros de se “imaginar e viver futuros onde suas pátrias, descendências, culturas e vidas seriam livres de qualquer tipo de opressão” (AIN-ZAILA, 2018, p. 5). Na literatura e nas artes, isso implica um afastamento da representação das pessoas negras em posições de subalternidade e um modo de retratá-las como agentes plenos de suas vidas, sendo capa

Um conto de Marithê Azevedo | "Céu Escuro"

Imagem
  Fonte: pixabay.com Um conto de Marithê Azevedo Céu Escuro* Hoje, os pássaros não cantaram ao amanhecer.   Não se ouviu, hoje, aquela folia de trinados orquestrados pelo acaso, que me acorda todos os dias, assim que o sol nasce.   Ouço apenas o barulho do caminhão-pipa passando pela rua de cima. E tosses na vizinhança, uma aqui, outra lá, duas ao mesmo tempo.   Meus olhos ardem e o colírio não resolve. Saí lá fora para ver o que estava acontecendo. Já eram sete horas da manhã e ainda estava escuro. Ninguém na rua, a não ser a ambulância do SAMU que parou em frente à casa da Dona Eulália. Parece que estão levando alguém. Uma fumaça   densa e escura invade a cidade, como uma cerração   impedindo a entrada da luz do sol. Entro em casa e tento ligar a televisão para ver as notícias. Está sem energia. Pego o celular. Está sem bateria. Um cheiro forte de carne queimada adentra o desvão da casa e empesteia tudo.   As luzes dos postes continuam acessas e a escuridão permanece.