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Artes integradas de Tere Tavares - Um Conto e uma tela

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Tere Tavares - Observadores (técnica mista) Quotidiano por Tere Tavares Via o vulto límpido da realidade se abrir lentamente. A morte é apenas uma linha que se precisa atravessar; o silêncio depois que a respiração cessa. Nada se pronunciava que não viesse eternizar o que havia em si de venerável. Manteve-se curioso. Não perdeu a capacidade de encontrar motivos. Nenhum romantismo o visitava desde a última decepção. Imaginou ter encontrado na reclusão uma forma de relacionar-se melhor com os intervalos entre razão e emoção. Estudava uma forma de jogar com ambas, no momento certo. Cria ser esse o ponto de equilíbrio mesmo que ausente da precisão imaginada mais propícia. [O jovem caminha mais rápido pela estrada, mas o ancião conhece os detalhes do percurso]. Ele se chamava Hully. Perdia-se nas inglórias que se instilavam na sua pele e lhe soletravam a vacuidade suspensa na testa, nas várzeas que as geadas cobriam. A paixão o devorava como os escar

A poesia que vem de Brasília - Elisa Ribeiro

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Imagem Pinterest - Graffiti MEIO-DIA, EM BRASÍLIA Quero-queros passeiam como se nada se passasse atenta aos meus passos, circundo os ninhos não quero que pese sobre meus ombros a culpa pelos ovos partidos. Ante os coletivos que circulam solitários vejo brotar marmitas em esquinas que não existem (cada um sobrevive como pode) nenhum carro para, eu, a pé, hesito em correr o risco — o dinheiro, o cartão, o toque, a mão — desisto de fazer a parte ínfima que me cabe que alguém mais nobre a faça por mim. Conforta-me a grama onde meus pés afundam sou grata porque meus pais já partiram minha geração assiste soturna a descontinuidade da sorte que tivemos até aqui.  IMPOSTORA Escrevo não porque esteja alegre ou triste mas porque a palavra que existe em mim insiste em tomar forma [como agora] Escrevo não para homenagear alguém Mas porque o verso me vem Do acaso, do além, da memória [semente invisível plantada em lugar propício brota] Escrevo também porque as pal

O DUPLO - um conto genial de Sonia Nabarrete

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Acrílico sobre tela de Wil Shepherd O DUPLO por Sonia Nabarrete O cientista decidiu construir seu duplo, que foi desenvolvido absolutamente à sua imagem e semelhança. A mesma aparência, a mesma personalidade, ele mesmo em dose dupla. A ideia é que o duplo ficasse com as atividades chatas, como acordar cedo, trocar pneu, discutir a relação, participar do almoço de domingo na casa da sogra, pedir empréstimo no banco, pagar impostos, ir à assembleia do condomínio, acompanhar a mulher nas compras. Ele ficaria apenas com o que é gostoso: comer e beber bem, viajar, ter uma vida cultural intensa, encontrar-se com a amante fogosa. Assim foi feito. O único problema era acertar as agendas porque ambos não poderiam ser vistos simultaneamente em lugares diferentes. Nem precisa ser cientista para saber disso. Qualquer estudante de Física sabe que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo. O cientista tomou precauções e a sua vida se tornou o sonho de qualquer homem. M

A Poesia grandiosa de Rita Santana - seis poemas

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Justyna Kopania Amanheceres O dia nasceu em deslumbramentos! Um céu de nuvens incandescentes Desfilava ao Sol que nascia O espetáculo do mundo. Cumpre-se a Solidão das turmalinas E a dispersão dos astros. Em mim, a rebeldia da existência acontece: Ergo-me esguia sobre o porvir. Devasto - no fundo de mim - coragens e âncoras. Precipito-me da cama desejando Alegrias, dessas que iluminam as manhãs E cintilam bandolins na alma. Inundo meu território com indulgências. Preparei as armas e os escudos A fim de vencer os ritos cotidianos. Para seguir é preciso mover os motores, Lubrificar as engrenagens e girar a roda. Fito o horizonte: tudo me alarma! Fito os elos desfeitos: há licitude em tudo. Justyna Kopania Aquarela Tudo é perecível! As Estações cavalgam sobre os dias, Fazem dos sonhos seu pasto. Exponho-me a cortes e mutilações, Pois envelheço de luas, marés e melancolias. Devasto vimeiras, salgueiros e várzea

Resenha do livro infantojuvenil NO RISCO DO CARACOL, de Maria Valéria Rezende

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(ilustração da capa: Marlette Menezes) UM CARACOL RISCOU MEU CORAÇÃO   por Nic Cardeal  Caracol é um molusco terrestre, que carrega nas costas uma concha em espiral - quase uma casa ambulante. Ele anda levando a concha sempre consigo e, quando necessário, guarda-se todinho dentro dela - é sua melhor proteção em momentos de perigo. Caracol também é um habitante do jardim de 'uma tal de Maria', que adora escrever haicais, 'quase haicais', romances, e tais e tais! Multiarteira essa tal de Maria! NO RISCO DO CARACOL é um livro infantojuvenil (poesia/haicai) escrito por 'essa tal de Maria' -  MARIA VALÉRIA REZENDE  - em 2008 (3a. edição em 2011, Belo Horizonte/MG: Autêntica), e lindamente ilustrado por Marlette Menezes. Foi vencedor do Prêmio Jabuti 2009 - 2° lugar na categoria infantil. A autora escreve, em forma de haicais e de 'quase haicais', sobre 'coisas' encontradas em seu jardim logo depois de uma chuva. Como ela di

Resenha do livro infantojuvenil ASDRÚBAL, de Silvana de Menezes

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(ilustração da capa: Silvana de Menezes) A INCRÍVEL VIAGEM DE ASDRÚBAL! por Nic Cardeal  ASDRÚBAL é um livro infantojuvenil (conto) escrito e lindamente ilustrado por  SILVANA DE MENEZES , publicado pela Editora Canguru (São Paulo, 2017). Asdrúbal é um menino de 6 anos, que habita o planeta Duotoni, onde tudo e todos são feitos de apenas duas cores. Seu melhor amigo é Aníbal, uma espécie de animal de estimação híbrido, nascido de um ovo, com "cabeça de peixe, asas de galinha, bunda de abelha e rabo de burro" (MENEZES, 2017, pg. 11), e que cresce muito mais rápido do que os demais habitantes do planeta Duotoni, inclusive, muito mais depressa do que o menino Asdrúbal! Asdrúbal é muito curioso acerca do espaço, do universo, das estrelas e dos planetas. Por isso passa a maior parte de seu tempo livre, depois da escola, no telhado da casa onde mora, olhando para o alto, sonhando com o alto, imaginando os diversos mundos bem distantes naquele alto. Até que um

Magia e delicadeza em uma história para crianças - por Ana Laudelina Ferreira Gomes

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imagem pinterest, sem anotação de autoria , Zambelê e a árvore dos amores I Zambelê e seus pais iam se mudar para um lugar bem longe de onde moravam. O menino viu a foto da futura casa, bem bonita, mas surpreendeu-se com o quintal, completamente vazio! Nenhuma plantinha nem dessas que nascem sozinhas, nem mato sequer! Foi quando sua avó Rosa lhe revelou um grande segredo: as plantas podem nascer das mãos dos homens. Zambelê ressabiou-se. - Como assim? Podem nascer plantas nas minhas mãos? A avó explicou melhor. - Não Zambelê, não nascem plantas NAS nossas mãos, elas nascem DAS nossas mãos. Nascem do trabalho de nossas mãos. Zambelê achou muito curioso que uma simples troca de uma letrinha a palavra pudesse mudar completamente o sentido do que a avó dizia. E ela continua a explicar: - São nossas mãos que cavam a terra para nela deitar as sementinhas, com as mãos as cobrimos com terra e lhes damos água de beber nos lugares onde as plantas forem plantadas.