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Mostrando postagens com o rótulo literatura de autora feminina

Reflexões sobre a escrita em tempos de isolamento - por Luciana Hidalgo

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Christen Dalsgaard - Um trecho do livro "Literatura da urgência" Acordei hoje pensando na “escrita de si” conceituada por Michel Foucault e resolvi disponibilizar aqui esse trecho do meu livro “Literatura da urgência” porque tem tudo a ver com nosso tempo de isolamento. A “escrita de si” como uma espécie de “cuidado de si”, exercitada na cultura greco-romana, é importantíssima nessa hora. Eu a utilizei para analisar o "Diário do hospício" de Lima Barreto, mas acho que pode ser útil a todos os confinados. Escrevamos, mais do que nunca. “Michel Foucault formulou o conceito ‘escrita de si’ no contexto de uma série de estudos sobre as ‘artes de si’ nas civilizações grega e romana. Partindo de uma démarche filosófica que investigava as relações entre subjetividade e verdade, o autor pesquisou a relevância do ‘cuidado de si’ na cultura greco-romana, mostrando como essa questão atravessou toda a reflexão moral, desde os primeiros diálogos platônicos até grandes t

A poesia plena de Angela Zanirato - cinco poemas

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Gabriel Moreno Iniciática     atravessei meu mar morto pra renascer ancoradouro de mim meus barcos naufragados submergiram à fúria de minhas ondas internas cicatrizei ferida do casco fechei vãos preenchi vazios -já entendo de tormentas e tsunamis sou anfíbia na noite plena de peixes. Gabriel Moreno Ziza grávida de seis meses ouviu comentários: vão prender o grupo dos onze! aqueles, que comiam rosas vermelhas o marido, ferroviário, fazia parte do grupo correu ao quarto esconder o livro de Marx subiu na escada o velho guarda roupa despencou sobre seu corpo o sangue escorreu pelas pernas lavou o chão a ditadura invadia também os úteros foi assim que a criança não nasceu um filho de comunista a menos disseram as famílias de bem da cidade. Gabriel Moreno Das vaidades   não é qualquer tábua que me salva não me prego em qualquer cruz choro a seco tudo que costura

Como me tornei uma mulher | Marilia Kubota

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Mosaico - Crônicas - 09 Como me tornei uma mulher Por Marilia Kubota A primeira vez em que ouvi a palavra sororidade foi em 2006 , num evento literário que organizei em Curitiba. Foi o contato inaugural com o feminismo. Até então, não relacionava os vários traumas envolvendo feminilidade e sexualidade sofridos desde a infância com o fato de ter nascido mulher. Mulher que gosta de pensar: o tipo mais odiado pela sociedade conservadora. Desde esta época aprendi muito, particularmente nos últimos três anos, quando aderi ao movimento Mulherio das Letras.  A interlocução com escritoras independentes, veteranas ou iniciantes, me fez entender o que é sororidade. Mulheres pensadoras e artistas são, por si, um fenômeno. Temos que vencer muitas batalhas para provar que "escrevemos tão bem quanto um homem." A primeira batalha é poder nos enxergar como irmãs, não inimigas. Não foram poucas as vezes em que fui ofendida por organizar eventos com mulheres. Ofensas de todos

Uma janela para o sobressalto

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MOSAICO Coluna 05    –  Crônica Uma janela para o sobressalto por Marília Kubota Na pandemia, pipocam conselhos sobre como preservar a sanidade mental durante a quarentena. Há entrevistas com padres, monges e religiosos acostumados a viver em clausura em monastérios. Ex-presos políticos descrevem a rotina nas celas em seu tempo da reclusão. Escritores e intelectuais defendem a necessidade da solidão como fonte de inspiração. Receitas para suportar o isolamento não variam. Silêncio. Meditação. Reflexão. Disciplina. Exercícios físicos. Leitura. Filmes.  . Há um mês, desde que a rua se tornou ameaça viral, passo tantas horas sozinha quanto antes da quarentena. A diferença é que não saio mais para ir a restaurantes, cafés, salas de cinema, teatro encontrar amigos, nem vou eventos literários. Cozinho em casa, vejo filmes por streaming - uma grande dica é o site do Petra Belas Artes, só exibe filmão, todos gratuitos - faço yoga e estudo por cursos online.

Um texto ficcional de Jennifer Trajano - Conto

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Mahmoud Said Materno por Jennifer Trajano o moço se perdeu como quem se perde em um parque. pensei isso hoje enquanto ouvia amor de loca juventude do buena vista social club, agora volto a pensar. era inevitável. aquele moço foi embora, perd eu-se no parque de diversões e deixou-me sozinha na gigante roda. nesse momento, perdi o fio de ariadne porque o minotauro era teseu e tudo estava aqui dentro deste corpo que não sai. ele se perdeu e não esperava que a mãe o achasse. fugiu, na verdade. o início? ah, foi em uma tarde quando saímos há uns anos. ele ainda não havia entrado em labirinto algum. não o achei tão bonito, era mais novo que eu. não sei como as coisas vieram parar aqui. como diria chicó “só sei que foi assim” e assim me fui. a juventude misteriosa no seu olhar “parecia um iceberg”, porém depois percebi: “era uma baleia branca”. ao me dar conta já havia aberto os porões do corpo inteiro. o início? eu só queria sexo, mas também não era tão bom. talvez nos apai

As fissuras do mal | Marilia Kubota

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MOSAICO Coluna 04    –  Resenha As fissuras do mal  por Marília Kubota O dicionário registra dois significados para a palavra fissura. Uma formal, que significa  pequena abertura longitudinal, fenda, rachadura ou sulco, e outra informal:  apego extremo, forte inclinação, loucura, paixão. Os personagens dos contos de livro "Fissuras", de Henriette Effenberger (Penalux, 2018) trazem estas rachaduras. São párias, indivíduos que habitam as margens da sociedade: trabalhadores de classe social  inferior, mulheres que sofrem violência doméstica, jovens delinquentes, idosos, religiosos. O eixo comum a todos eles é  o sentimento de solidão.   Henriette narra com destreza, revelando domínio da linguagem. Com enredos despretensiosos,  envolve a leitora ou o leitor em uma tessitura viva, de modo a surpreender no final. O fecho dos contos acaba sendo o ponto forte das histórias. As rachaduras sociais irrompem nas frestas, revelando um conflito entre o Bem e o Mal. Neste emb

Um Conto inspirado em canção de Raul Seixas - por Rita Santana

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Imagem pinterest  Ondas, Trânsitos e Trilhos por Rita Santana Já é noite. Há uma brisa entrando pela varanda do nosso quarto e a lua surge entre árvores altas com galhos secos. É uma noite iluminada, fresca e será a última noite em que estaremos juntos aqui em casa. Chego muito cansada do trabalho e encontro você calado, quase não me cumprimenta e sai para algum lugar. Mal olha pra minha cara. Está triste e seco também. Quando você está assim, a pele desidrata e você fica feio, o cabelo perde o brilho. Vivi alguns anos desse seu estado e sei ler a sua pele, a secura da sua boca, os seus olhos. Hoje, após tanto tempo, lembrei do cheiro de pó-compacto que, de vez em quando, identificava em seu rosto. Aquilo me irritava profundamente. Quando você está feliz, tudo muda e se torna o homem mais lindo e radiante do mundo inteiro. Volta logo. Ouço o barulho do carro, do portão, da chave destrancando a porta. Ouço o meu amor agonizando e o latido dos seus cães mortos. Ouço ainda