A POESIA FANTÁSTICA DE ROSEANA MURRAY | PROJETO 8M


fotografia do arquivo pessoal da autora 


8M (*)

Mulheres não apenas em março. 
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto, de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas, utópicas.
Mulheres de verdade, identidade, realidade.
'Dias mulheres virão', 
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
(Nic Cardeal)


Saboreie a poesia sempre fantástica da escritora ROSEANA MURRAY:

HORIZONTE

Se eu apagasse a fina linha
do horizonte
será que o céu cairia
no mar?
E as estrelas e a lua
começariam a navegar?
Ou será que o mar viraria
céu
e os peixes aprenderiam
a voar?

(* poema do livro Fardo de carinho)

capa do livro Fardo de carinho
-*-


CORAÇÃO À DERIVA

Pendurada
num fio de lua
como num trapézio,
lá do alto a sereia espia
o navegante solitário
no mar escuro,
dentro da noite,
no sobe e desce das ondas.
Para ele acende uma estrela.

Um anjo passa e de presente
lhe traz um par de asas.
Dentro dos olhos do navegante
a íris se transforma em fio de lua.
Seu coração vira estrela
enquanto o barco sussurra
e sobre as águas desliza,
rumo ao amanhecer.

Quando o dia derrama
suas últimas gotas de luz
dentro da noite
que tudo invade
com suas luas
e galáxias distantes,
nesse líquido mágico
a sereia se banha
e brilha e sonha.

As gaivotas acordam o mar,
parecem estilhaços
de branco no azul.

A sereia estica o braço,
abre a palma da mão
sem linhas:

Seu destino
é a eternidade
do mar.

(* poema do livro Coração à deriva)

capa do livro Coração à deriva 
-*-


PEDRA AZUL

Nos dias em que acordamos
do lado do avesso
e tudo parece que vira
abismo,
basta comprar
no Armarinho Mágico
a pedra azul de mudar
pensamentos.
Segure a pedra com força
e feito um moinho
moendo palavras,
tristeza vira alegria 
e dor e poesia

(* poema do livro Armarinho mágico)

capa do livro Armarinho mágico 
-*-


SANGUE NÔMADE

O sangue é nômade.
É o que está escrito
nas veias.
Grãos de areia, escombros,
tantas ruínas
e um trânsito intenso
sobre pontes
que atravessam continentes.
Nas bagagens,
pesadas pelo tempo,
as histórias se acumulam
entre as roupas.
O sangue é nômade,
e o ruído de passos
marca a linha que divide
o real e o devaneio.

(* poema do livro Poemas para metrônomo e vento)

capa do livro Poemas para metrônomo e vento 
-*-


CLASSIFICADOS POÉTICOS 

Menino que mora num planeta
azul feito a cauda de um cometa
quer se corresponder com alguém
de outra galáxia.
Nesse planeta onde o menino mora,
as coisas não vão tão bem assim:
o azul está ficando desbotado.
e os homens brincam de guerra.
É só apertar um botão
que o planeta Terra vai pelos ares...
Então o menino procura com urgência
alguém de outra galáxia
para trocarem selos, figurinhas
e esperanças.

Habitante de outra galáxia
aceita corresponder-se com o menino
do planeta azul.
O mundo desse habitante é todo
feito de vento e cheira a jasmim.
Não há fome nem há guerra
e, nas tardes perfumadas,
as pessoas passeiam de mãos dadas
e costumam rir à toa.
Nessa galáxia ninguém faz a morte,
ela acontece naturalmente
como o sono depois da festa.
Os habitantes não mentem
e por isso os seus olhos
brilham como riachos.
O habitante da outra galáxia
aceita trocar selos e figurinhas
e pede ao menino
que encha os bolsos de esperanças,
e não só os bolsos, mas também as mãos
e os cabelos, a voz, o coração,
que a doença do planeta azul
ainda tem solução.

(* poema do livro Classificados poéticos)

capa do livro Classificados poéticos 
-*-


ÁGUA DE PALAVRAS 

Às vezes desanimo
e me sinto inútil
portadora de estranha
doença
de que servem esses
poemas
água de palavras
frutos nascidos
de loucas sementes

de que me servem
se são menos
que estrelas cadentes
se são volúveis
se são voláteis
se fogem das mãos
como pássaros de renda
melhor seria esvaziar
as gaiolas com que tento
apreender o tempo
melhor seria derramar
no mar 
as minhas gavetas
tão cheias de fios
de noites cerzidas
melhor seria arrancar
de mim como erva daninha
essa linha que me descostura
e que me faz prisioneira
de miragens

(* poema extraído do site Pensador - www.pensador.com)

imagem do Pinterest 
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Caminhar sobre escombros
requer desmesurado equilíbrio
para que a alma
não se despedace
como um barco
entre as ruínas.
São tantos pedaços
de vida, 
do que se achava
que era nosso,
e no entanto.
Será que algum dia
será possível
reconstruir,
palavra por palavra?
Onde havia liberdade
há um silêncio opaco.

(* poema extraído de sua TL, março/2020)

imagem do Pinterest 
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(*) 8M: 8 de Março = Dia Internacional da Mulher: Projeto 'Homenagem a mulheres escritoras/artistas', iniciado em março/2021, por Nic Cardeal.


fotografia do arquivo pessoal da autora 


ROSEANA MURRAY nasceu no Rio de Janeiro e atualmente reside em Saquarema/RJ. É formada em Literatura Francesa pela Aliança Francesa, Universidade de Nancy. 

Começou a escrever poesia para crianças em 1980, com o livro 'Fardo de carinho', influenciada por Cecília Meireles, através do livro 'Ou isto ou aquilo'. 
Recebeu vários prêmios, entre eles, por quatro vezes o Prêmio de Melhor Poesia pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil; o Troféu APCA; o Prêmio da Academia Brasileira de Letras de melhor livro infantil; e, por diversas vezes a láurea “Altamente Recomendável" da F.N.L.I.J. 

Faz parte da Lista de Honra do Organismo Internacional I.B.B.Y, que abriga os melhores autores de literatura infanto-juvenil do mundo. 

Trabalha com o Projeto de Leitura Café, Pão e Texto, recebendo Escolas Públicas em sua casa para um café da manhã literário. Faz palestras sobre a Formação do Leitor.

Atualmente possui mais de cem livros publicados, entre eles: No mundo da lua (Paulinas/1983); Fardo de carinho (Lê/1986); Tantos medos e outras coragens (FTD/1996); Receitas de olhar (FTD/1997); Caixinha de música (Manati/2004); Território de sonhos (Rocco/2006); Poemas de céu (Paulinas/2009); Poesia essencial (Manati/2010); Carteira de identidade (Lê/2010); Poemas para ler na escola (Objetiva/2011); O circo (Paulus/2011); Diário da montanha (Manati/2012); Qual a palavra? (Paulinas/2012); Quem vê cara não vê coração (Callis/2013); Brinquedos e brincadeiras (FTD/2014); Manual da delicadeza de A a Z (FTD/2015); Coração à deriva (Rovelle/2015); Colo de avó (Brinque-Book/2016); Duas casas (Abacatte/2017); Jardins (Global/2017); Corpo e amor (Gradiva/2018); Armarinho mágico (Estrela Cultural/2018); Poemas para metrônomo e vento (Penalux/2018); Classificados poéticos (Moderna/2019); Nas entrelinhas (Matizes Dumont/2020); Com a lua nos olhos (Editora do Brasil/2020); Caligrafia dos sentimentos (Anitas/2020); Gatos (com William Amorim, Penalux/2020); Casas (Formato/2021); De malas abertas (Elo/2023); Montanha para andarilhos (Bambolê/2023); Balaio de felicidades (Estrela Cultural/2023); entre outros, muitos outros, inúmeros outros!





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