Para não dizer que não falei dos cravos 08 | A poesia, a composição musical e as ilustrações de WADO

 

Para não dizer que não falei dos cravos (08)


A poesia, a composição musical 
e as ilustrações de 
WADO, em

"ÁGUA DO MAR 
NOS OLHOS"



A GAIOLA DO SOM

Escrever é amarrar a palavra no passado 
E a palavra escrita é a gaiola do som

Ler é libertar a palavra
Que estava enclausurada no papel

Palavras gostam de voar
E ecoar o eco de seu pleno sentido
Sonoro

(* Wado, com Alvinho Cabral, Eduardo Bahia e Juca, do livro Água do mar nos olhos, p. 16 / canção no álbum cinema auditivo)

capa do álbum Cinema auditivo 

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ilustração de Wado, do livro Água do mar nos olhos, p. 50

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AMOR E RESTOS HUMANOS

Amor e restos humanos 
Depois do fim,
A construção já estremeceu
Maldade se faz assim,
Ou pior: restos de amor de um lado só 

Sinto não sentir
Mais que um abismo entre nós 

O grande jogo de escolhas, a vida
Poderia se chamar: vida
Certas verdades saltam da boca,
Certas maldades não têm fim

Sinto não sentir 
Mais que um abismo entre nós 

(* Wado, com Adriano Siri, do livro Água do mar nos olhos, p. 23 / canção no álbum o realismo fantástico - a farsa do samba nublado)

capa do álbum O realismo fantástico - a farsa do samba nublado 

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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 22

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A TRAGÉDIA DA COR

my brother sandro
a vida não tá fácil 
eu que não tenho cor
ando de trajes negros

você bem sabe em que ponta
a corda sempre arrebenta

mas ninguém sabe da dor
da tragédia da cor negra

são sobreviventes, arestas,
anomalias, nato fruto
da exclusão social neoliberal

eu escutei um tiro, a bala
saiu da ponta da caneta do
ministro, do deputado,
do senador que nunca
abre mão da sua corrupção 
diária, rotineira

não se percebe a doutrina
de violência e ódio nas torcidas
organizadas de futebol 

(* Wado, do livro Água do mar nos olhos, p. 25 / canção no álbum o manifesto da arte periférica)

                             capa do álbum o Manifesto da arte periférica

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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 21

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CIDADE GRANDE

Esta cidade é maior que todos nós 
E onde mais vamos procurar abrigo?
Mesmo assim, está bom: já foi melhor 
Mesmo assim: eu te quero aqui comigo

Alheio a isso, o sol 
Pratica seus feitiços 
Enquanto o manto negro da noite  se vai

E seguem os partidos, instituições 
Cooptando as almas, enquadrando os sonhos
E seguem os mendigos nas multidões 
Já são tão normais que nem mais emocionam

E nossos meninos, onde estão eles?
Estão nos morros em seus afazeres
E nossas crianças estão naquela 
E portam armas em nossas favelas
E as ambulâncias, pra onde elas correm?
Pros leitos lotados, as verdades doem

Alheio a isso, o sol
Pratica seus feitiços
Depois que o manto negro de noite se vai

(* Wado, do livro Água do mar nos olhos, p. 35 / canção no álbum vazio tropical)

capa do álbum Vazio tropical
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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 34

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FORTALECE AÍ

Fortalece aí meu coração 
Daquela força
Meu coração 

Nunca desista
Não se ausente
Coração 
Novamente 

Até mais tarde 
Até a noite
Juntos
Finalmente 

"Os meninos em volta da fogueira vão aprender
Coisas de sonho e de verdade
Vão descobrir como se ganha uma bandeira e
Aprender o quanto custa a liberdade"

(* Wado, com Adriano Siri,  do livro Água do mar nos olhos, p. 50 / canção no álbum terceiro mundo festivo)

capa do álbum Terceiro mundo festivo 

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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 34

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HERCÍLIO LUZ

À noite, o sol amadurece
A noite não é o que existe
A noite é: o que acontece.

Fechei os olhos
Chamei saudade 
Olhei pra dentro
Veio você, lá longe, bem longe.

Um amor, dois corações 
Quero você na minha utopia.
Um amor, dois corações 
Quero você na minha utopia. 

Hercílio Luz apenas para pedestres
E o beijo que tu me deste vou levar, lá longe,
Bem longe.

(* Wado, com Mia Couto,  do livro Água do mar nos olhos, p. 55 / canção  no álbum Atlântico negro)

capa do álbum Atlântico negro 

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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 46 
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LAR

É que os dias precisam vir depois das noites
É que é hora, agora, de seguir o açoite
É quando a morte a espreita e a solidão aceita 
É quando as nossas solidões se aceitam
Eu era seu lar, era em mim que você 
Costumava morar

(* Wado, com Vitor Peixoto,  do livro Água do mar nos olhos, p. 61 / canção no álbum 1977)

capa do álbum 1977

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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 58 
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SI PRÓPRIO 

Se é tudo por um triz
Você prefere:
Ter razão 
Ou ser feliz?

Há um céu suficientemente grande
Para todas as estrelas 
Que aí estão
E já não se faz questão 

Você só pode vencer a si próprio 
Só pode vencer a si
A si próprio 
Só pode vencer a si

Me diga com quem andas
E eu te digo
Se vou contigo

Há um céu suficientemente grande
Para todas as estrelas 
Que aí estão
E já não se faz questão 


Amor não há 
Em quase nenhum recanto
Ainda assim eu canto
E ergo a voz 
Por você, 
por mim, 
por nós 

(Wado, com Dinho Zampier e Zeca Baleiro, do livro Água do mar nos olhos, p. 88 / canção no álbum samba 808)

capa do álbum Samba 808

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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 81

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SURDOS DE ESCOLA DE SAMBA

Os surdos das escolas de samba 
Expandem o grave do coração 
Os cegos das escolas de braille
Esfregam os dedos noutra canção 

Um doce de amor aos pedaços:
Abacaxi, canela e limão 
Encontram na boca o espaço 
Ao que se presta a sua função 

É lindo, vai derreter 

Os mudos das escolas de canto
Esgoelam-se em mais um refrão 
E os mancos das escolas de baile
Dançam até gastar o chão 

Eu mudo sem os pés nos tamancos
Absurdo com as canelas no céu 
Aberto nas janelas do peito
Me aperto nesse abraço seu

(* Wado, com Chico César, do livro Água do mar nos olhos, p. 91 / canção no álbum samba 808)

ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 90

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SERENO CANTO 

Parece que havia uma vida
Pra viver...
Noutro lugar
Parece que onde estou não há
Parece, éramos jovens
Éramos belos
E agora parece
Que estamos velhos
E sem posses
Mas sem medo
O tempo é mesmo um rio
Parece que não foi em vão
E aqui vamos ficar
É esse amor
Que nós faz habitar
E calma vem-te forte
Seguir a corrente
E a sorte nos confira
A celebrar a vida
E nas vozes
Deste enredo
O tempo é mesmo um rio
Sereno é o canto de encantar
Estrada fértil pra plantar o amor
Sereno é o canto de encantar
Estrada fértil pra plantar o amor

(* Wado, com Marcelo Elísio Vianna Frota / canção no álbum a beleza que deriva do mundo, mas a ele escapa)

capa do álbum A beleza que deriva do mundo, mas a ele escapa 

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ilustração de Wado, no livro Água do mar nos olhos, p. 54

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UMA RAIZ, UMA FLOR

Não diga que as estrelas estão mortas
Só porque o céu está nublado 
Não se iluda, pé que dá fruta é o que mais leva pedra

E uma raiz é uma flor que despreza a fama

Olha, lá vai passar o terceiro mundo
E quem é de rir
Vai chorar de rir

(* Wado, com Alvinho Cabral e Georges Bourdokan, do livro Água do mar nos olhos, p. 99 / canção no álbum da banda Fino Coletivo)

capa do livro Água do mar nos olhos 

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fotografia do arquivo pessoal do autor 


WADO SCHLICKMANN FILHO é natural de Florianópolis/SC e reside desde criança em Maceió/AL. Graduado em Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas, é compositor e cantor, além de ilustrador. Possui composições gravadas por Zeca Baleiro, Chico César, Maria Alcina, Marcelo Camelo, Marcos Valle, entre outros. Como ilustrador, atuou na Gazeta de Alagoas e teve trabalhos publicados no eixo RJ/SP. 

Álbuns musicais lançados: Quem não é estranho não é normal (com a Banda Ball, 1998); O manifesto da arte periférica (2001); Cinema auditivo (2002); O realismo fantástico - a farsa do samba nublado (2004); Terceiro mundo festivo (2008); Atlântico negro (2009); Samba 808 (2011); Vazio tropical (2013); O ano da serpente (2014); 1977 (2015); Ivete (2016); Wado ao vivo no Rex (2018); Precariado (2018); A beleza que deriva do mundo mas a ele escapa (2020); MarxWado (2023).

Livros publicados: A ilha de Laura (livro infantil de Amanda Prado, com ilustrações de Wado, Maceió/AL: Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2015); Água do mar nos olhos (composições musicais/poesia e ilustrações próprias, Maceió/AL: Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2018); Caderno de anotações (aforismos, letras de 'canções mudas', poesias e 'não poesias', Maceió/AL: Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2018). 








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