De Prosa & Arte | Datas Comemorativas

 

Coluna 6


Datas Comemorativas 



Eu tenho refletido sobre datas comemorativas. E não é de hoje. Tudo numa sociedade vira comércio e especulação financeira. As lojas ficam cheias e nos estapeamos como abutres em cima das ofertas.

Com licença, por favor, obrigada, Boa sorte, bom dia, deixaram de ser usados com frequência. Viraram luxo. A gente se surpreende quando escuta.

Eu fico melancólica e nostálgica perto do fim do ano especialmente no Natal.

Gosto mais de lembrar a sensação desta data na infância, quando depois da meia noite meus tios e tias vinham com um sacolão imenso cheio de coisinhas do Paraguai: caneta de 12 cores, Estojo, ioiô luminoso, bola e corda que tocava música.


E a gente brincava junto com irmãos e primos. Era uma alegria tamanha.

Minha mãe me colocava a melhor roupa e me penteava os cabelos. Botava um brinquinho brilhante e uma sandália novinha.

Tinha ponche com champanhe e com guaraná, às vezes na peraltice infantil a gente errava os potes.


Depois de comer, beber e brincar de barriga estufada era hora de dormir. 

Aí os adultos enrolavam o tapete da sala, botavam música na vitrola e rodavam samba rock até amanhecer.


Eu ficava escondida no vão da escada admirando aquela gente preta - o meu povo - com alegria e orgulho. Queria logo crescer pra ficar acordada até tarde.

eu ficava, escondida mas ficava. Daí talvez a minha mania boêmia que perdura.


Hoje a gente não sai de porta em porta dando feliz Natal aos vizinhos. Os presentes ganhos são pra brincar individualmente e isolado. Sinto saudade dos cartões da minha vó: letrinha trêmula… minha anciã poetisa, saudade da sua gargalhada de corpo jogado pra trás. Sinto saudade da música na vitrola. Ainda tem, mas a gente quase não dança.


Depois de comer se queda cansado numa cadeira qualquer vendo as crianças pisotearem os brinquedos menos interessantes porque tem nas mãos tablets, celulares, sonhos ambiciosos postos nas mentes, pelas caixinhas luminosas que lhes tira o poder criativo e o sentimento de solidariedade.


Acho que não gosto mais do Natal. Ou de dia das mães, pais, namorados, etc.

Parecem datas que hoje usamos pra reparar as bobagens que cometemos com as pessoas.


Eu não monto mais árvore. Às vezes quero. Mas acho bobo um pinheiro fake com as pontas pintadas de branco imitando neve. Num baita calorão que faz aqui, enfim... estou velha e chata. Acho que é  isso!


Daqui a pouco completo 42 anos. Essa melancolia pessimista deve ser o inferno Astral que antecede o êxtase que me causa soprar mais uma vela. Hoje estou triste e chateada. Muitas coisas aconteceram a tanta gente durante a semana, todos esses meses: perdas materiais e de pessoas próximas. Crise financeira e política. Perda de direitos. Tá difícil celebrar. Tô numa ressaca moral.


Vou agradecer à vida, a família, a saúde e a fé no poder criativo e curativo das palavras. Esperar que esses próximos dias sejam mais leves. Ou que eu os torne mais leves. Porque o espírito de comemoração tá machucado não é de agora.


Esse ano não deu mesmo pra comemorar. Mas muito em breve. Iniciamos um ano novo. Com tudo que levaremos deste que ainda nem foi e já nos matou o viço.

Que estejamos preparados. Que seja possível ao menos sorrir. Axé! 


#christmasfeelings





Comentários

Postar um comentário

PUBLICAÇÕES MAIS VISITADAS DA SEMANA

Mulher Feminista - 16 Poemas Improvisados - Autoras Diversas

200 palavras/2 minicontos - por Lota Moncada

A POESIA FANTÁSTICA DE ROSEANA MURRAY | PROJETO 8M

Nordeste Maravilhoso - Viva as Mulheres Rendeiras!

De vez em quando um conto - Os Casais - por Lia Sena

Cinco poemas de Eva Potiguar | Uma poética de raízes imersas

Preta em Traje Branco | Cordel reconta: Antonieta de Barros de Joyce Dias

UM TRECHO DO LIVRO "NEM TÃO SOZINHOS ASSIM...", DE ANGELA CARNEIRO | Projeto 8M

Uma resenha de Vanessa Ratton | "Caminho para ver estrelas": leitura necessária para a juventude

Resenha 'afetiva' do livro O VOO DA GUARÁ VERMELHA, de Maria Valéria Rezende