De Prosa & Arte | December Bday

 


Coluna 10


December Bday

Há 42 anos atrás, às 03h40 sob as bênçãos de Ogum, eu nascia. Um pouco de negra velha, um tanto do brilho de Oxum, tempestades de Iansã, estou certa de que chorei em si sustenido. 


Música minha força motriz, acordes e canções minha salvação para um ano que tinha tudo pra dar errado e que deu. Mas como diria S. Vaz “agora que já deu tudo errado, tem tudo pra dar certo”


Música foi meu alimento diário, nos palcos virtuais, na gira do Terreiro. Eu fui teimosia, medo, tristeza, dor extrema, criança espoleta, menina inquieta, adolescente rebelde, jovem sonhadora, mãe e desequilíbrio. 


Há quem ache que sou uma bomba-relógio… tô picas para isso. Eu (re)inventei minha fórmula, meu modelo de ser. Não sou afeita a padrões pré-estabelecidos, quase não pude fazer escolhas físicas, acabei sendo escolhida muitas vezes. 42 anos é um bom bocado de tempo e quase nada pra quem intenciona viver pelo menos mais uma cota disso. 


Família: estou focando na nuclear, meus bebês, que já nem são tão bebês. Parei de brigar aos domingos e me permito sentir saudades de “mamys poderosa” porque o encontro é diliça quando nos vemos. Esse ano nos vimos pouco e numa tela quadrada.


Amor: estou refazendo este conceito e aprendendo novas formas a começar pelo próprio e ao respeito pelos meus desejos. 


Trabalho: satisfeita com o que conquistei até aqui. E não foi pouco, foi desgastante mas intenso, estimulante, daqui só pro alto e avante!


Amigos: tenho um balde cheio, transbordante e adoro: são tão diversos, tão inteiros, cheios de música, poesia, fé, são multicolores, crianças, jovens, adultos e velhinhos.


Encontros: quero muitos, pois este ano aprendi que eles me fortalecem, me completam, me ensinam, me constroem. E a distância foi cortante. A tela azulada não comporta nossa busca pelo brilho das retinas.


Saúde: preciso cuidar mais, creio ainda estar bem pra uma jovem senhora.


Sexo: quero, gosto pracaramba e preciso exercitar. Com 42, quantidade é balela, qualidade é a meta.


Dança: vou retomar! Mas esse ano dancei comigo no meu próprio ritmo embalada pelos encantados.


Religião:  sou de Axé... me animo na gira, o som dos tambores ecoam na alma e me levam a outros universos possíveis de existência e completude. A força dos caboclos, a sabedoria dos pais velhos, a pureza das crianças, a força do movimento dos Guardiões. Religare. Religuei com o Astral!


Poesia,  juntei cacos dos meus versos soltos e fiz canções. Vi os pretos ecoarem lições da nossa quebrada e da nossa luta, nesse ambiente interdimensional que a tecnologia nos provocou a acessar e compreender. Cresci um tanto… 


42 anos, não canso de dizer, não tenho essa vaidade de quem esconde a idade ou que se preocupa com as rugas que surgem, com a lei da gravidade tão implacável.

As coisas caem e ficam flácidas mesmo. O que não pode envelhecer e murchar é a busca, é o sonho, é o viço de existir como se é.


Eu sou a Negra professora, louca por música e poesia, cheia de manias bobas. Faço piadas de quase tudo, me apaixono todo dia por coisas e pessoas novas. 

Sou visceral, afoita, tenho pressa, anseio futuro. 


Dentro de 14 dias completo uma volta em torno do SOL. Sabe esse inferno Astral que antecede o gozo? 


Estou vivendo. Aquela porção decantada no fundo do pote foi mexida. Não há possibilidade de recuos. Não há solidão em ser quem se é consigo mesma. Há certeza de que nem tudo está como planejado. Mas tudo está no lugar que devia para que eu aprenda o jogo, jogando.


Esse ano quando explodirem os pirotécnicos luzindo no breu da noite, anunciando o fim. Será o recomeço que preciso. Estou pronta!







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