RESENHA do livro infantojuvenil OS NÚMEROS PRIMOS E SEUS SOBRINHOS, de GLORIA KIRINUS


QUEM SÃO OS SOBRINHOS DOS PRIMOS?

por Nic Cardeal 

É bem provável que você já tenha ouvido falar dos números primos! Você sabia que eles também têm sobrinhos? E você sabia que a tal da 'dona Matemática' não é nenhum bicho de sete cabeças? Nem de seis, cinco ou quatro! A 'dona Matemática' é uma velha conhecida lá das épocas mais antigas e, que eu sei, ela tem uma única cabeça, na verdade é bem dotada de inteligência essa tal de Matemática!

Pois bem! Eu soube disso quando li OS NÚMEROS PRIMOS E SEUS SOBRINHOS (Porto Alegre, RS: EDELBRA, 2016), um livro infantojuvenil escrito por GLORIA KIRINUS, e muito bem ilustrado por Martina Schreiner, que conta, de forma divertidamente inusitada e lúdica, a história dos números primos e, é claro, seus sobrinhos!

Diz a escritora que, quando o primeiro daquela família de números nasceu, foi aquela festa! Pai e mãe o chamaram, em princípio, de Príncipe! No entanto, logo viram que ele era caso de maior, muito maior importância, então o batizaram de 'Único, o indivisível'! Isso mesmo: "(...) - Sim, naturalmente, Único, padre. Nosso filho é assim. Inteiro e concreto por natureza, sem perder sua real realeza, sim, senhor, que de números imaginários o mundo das raízes quadradas e os castelos dos contos de fadas estão cheios (...)" (2016, p. 5).

E a mãe, enquanto lavava a panela da janta, ou procurava na estante da sala outro livro para ler, filosofava entre os tijolos da parede da casa: "(...) Se cada tijolo é Único, sozinho, não formaria parede. E parede faz par com outra parede até formar um cubo, um cubículo, um quartinho, uma casa (...)" (2016, p. 6).

O filho, preocupado, queria se chamar Unidade, porque na sua ideia primeira, sozinha e única, achava que só "(...) Unidades formam paredes, tetos, conjuntos, até constelações... (...)" (2016, p. 6).

Mas Único seguiu sendo ele mesmo, único, inteiro, primeiro... E a vida passou algum tempo fazendo contas - somando, subtraindo, multiplicando, até dividindo - como sempre acontece, como sempre deve ser nessa 'histórica matemática' de se viver! 

O que o pequeno sabia, com todas as certezas herdadas de sua família ordeira, ordenada, de números primos, era que ele era Único, o primeiro! Sua dúvida continuava sendo apenas uma: Único ou Unidade? Quem responderia essa pergunta ao filho único daquela família 'numerada'?

E Único seguiu sendo ele mesmo, filho único e sozinho... Até que um dia olhou pra barriga da mãe e notou algo estranho. Ela estava maior. Bem maior. Lembrou do varal repleto de roupinhas miudinhas -  um bebê seria o motivo? 
"(...) Mas agora vem mesmo um irmão. Único não seria o mesmo. No mínimo seria menos Único. Na verdade, alguns dias ele amanhecia com sentimento de zero à esquerda (...)" ( 2016, p. 11). Único ficou confuso. Ele continuaria sendo o Único, ou com a chegada do irmão (ou da irmã?), ele não seria mais o único? Será que o mundo poderia ser feito de muitos únicos? E seu irmão (ou irmã) seria 'o' Segundo, ou 'a' Segundo? Sendo Segundo, Único deixaria de ser único? As perguntas saltitavam que nem cabritos insones na mente numérica do filho primeiro... pois o que ele mais queria eram respostas para aquela 'matemática incógnita' morando na barriga da mãe... 

E a barriga da mãe crescendo, aumentando, numa soma prolongada de nove meses inteiros... Seria a famosa tal 'prova dos nove'? Único então lembrou: "(...) Se pelo menos o número nove fosse primo e não irmão. Primo é mais distante que irmão. Melhor ainda se fosse sobrinho. Ah, se fosse sobrinho, o Único ficaria mais singular, sem plurais por perto atrapalhando seus lugares, pensou Único numericamente (...)" (2016, p.13).

Único foi para a escola. Talvez o professor de matemática explicasse as dúvidas que se atropelavam, entre somas e subtrações, nos pensamentos do número primeiro: "(...) O número nove é primo, primor ou primordial? (...) - E se não fosse nada disso, então, o nove seria número sobrinho, sobrante ou sobra? (...)" (2016, p. 14). Depois de tantas perguntas, o assunto das aulas virou febre, virou festa: todos queriam saber do 'parentesco' dos números - quais seriam os primos, os sobrinhos, os tios... quem seria a 'nova dinastia dos sobrinhos'... como se multiplicavam os números primos, aumentando drasticamente a família dos números compostos... 

No meio daquela 'festança matemática' de números, Único deixou de ser o único, mesmo sendo pra sempre 'único' (ele mesmo, ninguém igual!): porque nasceu seu irmão, o Segundo, modificando toda a história dos primos e sobrinhos na família do filho Único!

Para você saber mais detalhes desta 'história matemática' da Gloria, é só ir atrás desse livro incrível, porque, de um em um, cada livro também é único, e uma hora ou outra a pilha acaba! Ou você vai querer ficar a zero, sem poder conhecer o final dessa incrível história dos 'números primos e seus sobrinhos'? Acho mesmo que não, pois ouvi contar que você também é louquinho(a) por essa 'dona Matemática', que nem aquele velho professor do Único e do seu irmão Segundo, o tal do senhor Malba Tahan...




GLORIA KIRINUS é peruana, naturalizada brasileira e residente em Curitiba/PR. Graduou-se em Turismo pela Escuela Nacional de Turismo em Lima (ENT) em 1971; em Letras-Português pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) em 1986; em Letras-Espanhol pela UFPR em 1991; especializou-se em Literatura Brasileira pela UFPR em 1987. Concluiu o mestrado em Literatura Brasileira pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUCRJ) em 1991; o doutorado em Letras pela Universidade de São Paulo (USP) em 1998; e o pós-doutorado pela Université Paris Descartes em 2014.

Colaborou com páginas de poesia, crônicas e ensaios, no Caderno G da Gazeta do Povo, e já foi jurada por mais de 10 anos do Prêmio da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.


Recebeu o título 'Mérito da Educação' no Estado do Amapá, e o prêmio 'Bosque de Leitura' na cidade de Ponta Grossa-PR, entre outras distinções. É integrante da Federação Internacional de Educadores Freinet, da Associação de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil e membro do Conselho Consultivo do site de Leitura e Literatura Infantojuvenil. 


É tradutora literária, além de criadora e ministrante da oficina de criação literária e pedagogia poética, Lavra-Palavra. Escreveu os  seguintes livros bilíngues de literatura infantil e juvenil: 'Quando Chove a Cântaros' (Cuando llueve a cantaros), 'Te conto que me contaram' (Te cuento que me contaron), 'Tartalira', 'Quando as montanhas conversam' (Quando lós cerros conversan), 'O galo cantou por engano' (El gallo canto equivocado), 'Se tivesse tempo' (Se tuviera tiempo), 'Sete quedas, sete anões e um dragão' (Siete cascatas, siete enanos y um dragón) e 'Lâmpada de lua' (Lámpara de luna). Também publicou, em português, os seguintes títulos: 'Aranha castanha e outras tramas', 'O sapato falador', 'Menino do mar', 'Entre dezembro e janeiro', 'Os números primos e seus sobrinhos', 'O camelo e o camelô', 'Carta para el niño', 'Formigarra, Cigamiga', 'Um barco em meu nome', 'Um sol em meu nome', e 'Um antônimo em meu nome'; além dos livros teóricos na área de Letras e Educação ('Synthomas de poesia na infância' e 'Criança e poesia na pedagogia Freinet'). 

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